segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Desejo





Ela subia a escada com o coração muito acelerado. A cada degrau alcançado, tinha o entusiasmo e o medo cada vez mais confundidos. Mesmo assim, não conseguia parar de subir. Ao mesmo tempo em que as milhões de borboletas em sua barriga lhe diziam para voltar, também diziam que deveria prosseguir para poderem voar logo dali. Ela se agarrou a essa sensação e prosseguiu.

Nunca aquela casa estivera tão silenciosa e escura. Ou era uma impressão sua? Todos deveriam estar dormindo a sono solto, dada à hora extremamente tardia que atropelava a madrugada. Aliás, ela é quem deveria dormir da mesma forma, mas não havia pregado o olho uma só vez. Eram tantos os pensamentos que a atormentavam, causando-lhe insônia, que chegou a uma decisão que preferiu não repensar quando levantou de sua cama. E agora estava ali, fazendo o maior esforço possível para não emitir nenhum ruído e entrar no quarto desejado.

No último degrau, avistou a porta no final do corredor, ao lado direito. Todas as demais portas estavam fechadas igualmente, o que, para sua felicidade, diminuía a chance de que algum barulho pudesse acordar alguém. Em questão de segundos, já estava em frente a porta. Girou a maçaneta com muito cuidado. Estivera raras vezes naquele quarto, até porque, apesar de o irmão mais velho de sua amiga ser muito receptivo, tinha vergonha de gostar tanto dele e, por isso, seu quarto era um tipo de templo sagrado. Ele não parecia se importar tanto com ela por perto. Nada mais normal. Questão de simpatia. Ela era amiga de sua irmã e sempre estava pela casa.

Mas, naquela noite, esqueceu sua timidez e entrou furtivamente naquele quarto. Talvez tenha feito isso por  causa do sonho que tivera com ele na noite anterior que a fez acordar em poças de suor. Talvez porque não aguentava mais não conseguir ficar sozinha num mesmo cômodo com ele sem querer sair correndo de vergonha. Talvez porque ela queria simplesmente saber qual a sensação de estar tão perto de quem a faz sonhar acordada todos os dias sem que fosse intimidada pelo seu olhar. Afinal, ele dormia.

Nem pensava nas consequências se um dos pais de sua amiga, ou a própria, aparecessem ali. O que mais ela queria era observá-lo mais de perto, pois nunca tivera tamanha coragem. Andou até o lado da cama e viu que ele dormia serenamente. O lençol que o cobria estava bagunçado por entre suas pernas e revelava um corpo perfeitamente torneado. Nada além do lençol o vestia. Ela foi tomada por uma onda de calor que não podia ser justificada pela estação em que estavam. Desejou cada parte daquele belíssimo homem fervorosamente.

Sem que mal percebesse, já estava sentada ao seu lado e passava suavemente seus dedos por aqueles braços musculosos e ficou a imaginar tudo o que poderiam fazer com ela. Totalmente hipnotizada. Já estava com a mão em seus cabelos. Eram castanhos e lindamente bagunçados. Olhou-o de cima a baixo minuciosamente e sentia que seu próprio corpo pegaria fogo a qualquer minuto. A única coisa que parecia certa naquele momento era beijá-lo. Seria um desperdício se não o fizesse. Não queria mais nada além daquilo. Um beijo e tudo estaria bem. Nem que fosse por apenas um segundinho. Depois iria embora sem que ninguém notasse, nem ao menos ele.

Ela se aproximou de seu rosto a ponto de sentir sua respiração. Seus lábios foram se tocando vagarosamente e ela podia sentir o calor de sua boca. Não recebia o beijo de volta, mas a sensação já era maravilhosa. Abriu os olhos. O olhar que ela tanto se acostumara a evitar a fitava de volta. De todo aquele jeito penetrante. Repentinamente seu coração foi tomado por pontadas violentas e levantou da cama abruptamente. Muda e estática, não sabia o que fazer e não tinha forças para fazer nada mesmo se quisesse.

Ele se ergueu vagarosamente até estar completamente sentado, sem desviar seus olhos dos dela. Sem pudor algum pela sua falta de roupa, continuou a observá-la com aqueles olhos assustados, mas ainda sonolentos. Seu interesse oscilava entre o que estava acontecendo e o que faria a seguir com a situação. Colocou-se, então, de pé. Ela: pernas bambas. Com expressão de determinação, ele foi se aproximando e segurou seu rosto para um beijo incrivelmente intenso. Logo ela já era envolvida pela firmeza de seus braços que a levavam para cima da cama. A ferocidade com que se abraçavam e beijavam não cedia espaço para nenhum tipo de diálogo. Nada precisava ser dito para entender que o desejo de aquilo um dia acontecer se acumulava para ambas as partes. Ele puxou os grandes cabelos negros dela pela nuca e beijou seu pescoço vorazmente, deixando-a em estado de êxtase.


Uma madrugada. Uma casa silenciosa. Um quarto. Um desejo.
Duas respirações ofegantes.


...




Viviane Botelho



O Universo agradece