segunda-feira, 22 de março de 2010

Filme de Terror


Era domingo, à noite. Já havia me arrumado e esperava pelo meu pai e irmão pra irmos a igreja, como de costume. E como chovia. O céu parecia estar em fúria se rebelando com todas as suas forças a base de água. E por mais que eu estivesse protegida debaixo do teto da garagem daquela violência lá fora, sem necessidade, o guarda-chuva continuava me abrigando. Não me dei conta. Eu parecia hipnotizada observando toda aquela tempestade. E aquilo me deu medo. Medo por saber que existem coisas muito piores do que uma forte chuva.
Foi aí que fui pega de surpresa por um estouro vindo da rua e, de repente, o bairro inteiro virou breu. Dentre todas as luzes dominadas pela escuridão, a luz da garagem continuou acesa, sabe-se lá o porquê. Mas fraca. Depois de uns dois minutos apagou de vez como todas as outras. Conclusão do momento: finalmente, meu pai e meu irmão apareceram e saímos. Como era de se esperar, o guarda-chuva não protegeu nada além do topo da minha cabeça.
Voltamos pra casa e, que maravilha, a luz voltou!
Bem, parcialmente. Todas elas estavam fracas e a televisão fazia um barulho bem estranho. Não sei como não queimou. Mas não demorou muito e a luz começou a piscar. Piscou três vezes até cair de vez. E, que raiva, bem no meio do programa. Pelo menos não ouvi meu irmão gritando pela casa com medo. Ele já dormia nessa hora. Mas é normal. São as crianças que tem medo do escuro e dos monstros que podem aparecer, certo?
Daí, comecei a escrever para não perder, como uma amiga minha costuma dizer, o “fio da emenda”. Quando não se tem nada melhor pra fazer eu resolvo pensar em alguma coisa e escrever. Nesse caso, em especial, o fiz porque sei que não são só as crianças que têm “medo do escuro”. E admito que, por ser fã e admiradora de filmes de terror, quando estou no escuro tudo aparece na minha frente: a Samara com aquele cabelão preto dela e toda molhada vinda do poço; o palhacinho de brinquedo bizarro dando aquela risada que precede as famosas frases “Do you wanna play a game?” e “Make your choice”; A Kayako toda torta, de boca aberta e fazendo aquele barulho esquisito junto com o filho Toshio; A Emily Rose virada no chão com a pupila hiper dilatada e por aí vai. Cômico sim, mas são personagens que deixam a cabeça cheia. Essa é a intenção dos filmes. A vontade é de me enfiar no primeiro buraco e nunca mais sair quando fico no escuro sozinha. Sou medrosa, mas a curiosidade ganha e acaba passando por cima disso. Por isso a fixação por filmes de terror e suspense.
Cá pra nós, é no momento em que as luzes se apagam que percebemos a nossa fragilidade e insegurança. Hipócrita pra mim quem disser que não tem medo de estar no escuro. Ou que não sente uma pontinha de aflição quando está sozinho em casa e é surpreendido pelo breu. Sempre vem alguma coisa diferente à cabeça nesses momentos. Não precisa ser nada sobrenatural, que seja o receio de que um ladrão apareça ou que um gato voe em cima de você. Só admita que é uma fraqueza natural. Natural porque analisando mais a fundo descobrimos que a escuridão nos lembra, na verdade, a morte. E a morte mexe conosco, mexe com qualquer um. Lidar com a morte é o como lidar com a escuridão: você não consegue. Tudo por causa do desconhecido.
Por mais que tenhamos nossas convicções sobre como será depois de morrermos, não teremos certeza dos detalhes até chegarmos lá. Nosso medo não é da morte, é do que está por trás dela e não podemos ver. Nosso medo não é do escuro, é do que está por trás dele e não podemos ver. Somando as sentenças: temos medo de tudo que não conhecemos. Eureca! O ponto fraco do ser humano que nunca se contenta em não conhecer e entender tudo. Afinal, não são as respostas que movem o mundo, são as perguntas.
Mas quem disse que precisamos saber de tudo? A vida não teria graça se tudo nos fosse revelado de mãos beijadas. Não acha? Apenas faz parte. Então, acenda uma vela e escreva um poema. Eu garanto que isso não dá medo nenhum.



Viviane Botelho

O Universo agradece